domingo, 25 de setembro de 2011

"Verdade Inventada", crônica de João Soares Neto para O ESTADO



Com uma semana de antecedência ela comemora a sua data. Tem pressa para viver no presente. O passado está emoldurado. E o faz cercada da família, das filhas meninas, de um batalhão de colegas e amigos que a acompanham desde o “Canarinho”, o “Santa Cecília”, o “Batista”, “Boca Ciega” e a UECE.
Como defini-la? alegre, irreverente, avant-garde, comunicativa, derramada, afetiva, curiosa, corajosa, calorosa, inteligente, braba, meiga, chorona e beijoqueira.
Nasceu em uma sexta-feira, o dia em que todos se preparam para a festa que é o fim de semana. Ela foi à festa. Primogênita em série que a sucedeu com o mesmo calor, amor e carinho. No seu convite, cita, de forma resoluta, Clarice Lispector: “Não quero ter a terrível limitação de quem vive apenas do que é passível de fazer sentido. Eu não: quero uma verdade inventada”. Parece que acertou em cheio. Sua vida é verdade inventada por ela mesma, sem palpite de pai ou mãe.
Fui, além da mãe e da equipe médica, o primeiro a vê-la e beijá-la. Que nome dar a ela? Havia comprado um livro com centenas de nomes, mas nada ficara decidido. A mãe, pressurosa, sugeriu o nome de uma czarina russa. Assim ficou. Como pai-coruja já estava escrevendo deslumbrado no seu livro do bebê. Depois, abreviei o nome, de forma mais conexa.
Primeiro dia de aula. Lá fomos, a mãe e eu, levá-la ao maternal. Haja choro. Nós acabamos chorando, também. Depois, veio a adaptação e a formação de laços de afeto com os coleguinhas. Acontece que a vida não produz só flor. Dizia o doce Vinícius que “filho é uma raiz de dente exposta”. Passamos sete dias em Belo Horizonte. Legal. Findo o maternal, era hora de procurar colégio novo, maior e adequado para o seu perfil. Vai para o Santa Cecília onde esteve por anos. Fazia parte do processo. E a menina recebeu, com alegria, a chegada das irmãs, uma, duas e três. A última, por mãos da natureza, nasceu no mesmo dia que ela, por conta de uma casa de bonecas.
Começam as aulas de balé, aprender a nadar e o inglês. Festivais, carnavais e que tais. A casa de praia nas férias em que ficávamos brincando e recebendo amigos. Quebra um braço e lá se vai o fim de semana para o ar. Chega a puberdade, florescem dúvidas, abrolha a angústia. Nós, atentos e confusos, sem saber como lidar com as mudanças advindas para todos. Surge a ideia do intercâmbio nos USA. Viajo como destacamento precursor, para ver escola, conversar com a direção e acertar, com os tios, a estada. Levei e voltei com duas, carro atulhado, pois a segunda a acompanhava. Fez amizades com colegas e uma delas deve estar agora na festa de que falei no primeiro parágrafo. Choro em rodoviária. Termina o colégio e entra direto na Universidade Estadual do Ceará.
Lá do outro lado da cidade, todos os dias. Mesmo com resmungos, ups e downs, termina o curso sem problema. Resolve estudar teatro e participa de curso completo na Unifor. É bom lembrar ter sido sempre a coreógrafa de sua turma. Reunia irmãs e filhos de amigos comuns, montava peças, desfiles e jogos, tudo sob os nossos olhares.
Viajou mundo afora. E a moça quis casar. E assim o fez, como quis, concebendo duas belas filhotas. Agora, no limiar da segunda metade do existir, decide, cria, arregimenta família e amigos para um “happening” vespertino com o seu feeling e modo de ser. Parabéns, Deus a abençoe, agora e sempre. Cheiro. Estou por perto. Take care.

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