terça-feira, 14 de agosto de 2012

"Avenida dos Ventos", de Maria Thereza Leite, na Cultura (23.08 - QUI)

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Lançamento
Data: 23 de agosto de 2012, às 19h
Local: Av. Dom Luiz, 1010 (Shopping Varanda Mall)

Sobre a Obra:

Acabo de chegar de uma fantástica viagem ao mundo encantado da ilusão. Passageira de primeira classe, sorvi cada detalhe desses caminhos tão doces, tão densos, tão misteriosos, tão únicos. Usando o ritual que se deve exercer ao tomar um bom vinho, assim procedi. Absorvi as paisagens desta Avenida dos ventos com recolhimento, atenção e respeito. Fiquei abastecida. O livro, singular e belo, nos toca a alma, transmutando-nos em andarilhos sedentos e curiosos ao que nos conta esta artesã do conto.
Thereza Leite resgata do esquecimento a Avenida dos ventos numa alegoria de prazeres, encantos, dores e surpresas. Cuida, outrossim, que o tempo não caduque, temerosa de que percamos de vista essa avenida e suas ruas, oficinas, parques, sobrados, domingos, ribeirões, labirintos e ventos. Esses, mencionados na quase totalidade dos contos, o que vem a conferir unidade à obra.
Destaque ao feliz emprego das metáforas, certamente responsáveis pela beleza, iluminação e movimento das estórias. Ressalte-se no conto primeiro o perfeito emprego metafórico: “A avenida já queria se mostrar, mas ainda não tinha sido peneirada”. Ou ainda na “Oficina do segredo”: “As flores inquietas no vestido”. Passagem de igual beleza no conto “Ribeirão do tempo”: “A casa tinha sido amordaçada”.
Thereza Leite, já consagrada contista, detentora de vários prêmios literários, convida-nos ao encantado mundo “onde nascem os ventos gemidos”. Toma-nos a mão para galgarmos “O Sobrado”. De lá, “As visões do labirinto” ultrapassam “O ribeirão do tempo”. Portanto, não há pressa. A Avenida dos ventos ai está. A nossa espera. Cheia de encantos...

Neide Azevedo
Escritora e membro da Academia Cearense da Língua Portuguesa


Thereza Leite é uma contista urbana. Canta a cidade pelo viés da memória. Ganha prêmios literários aqui e em outros estados. Agora nos aparece com essa sua coletânea de contos com o sugestivo título de Avenida dos ventos. Apesar de ser produto de elaboração ficcional, percebe-se, ao longo das narrativas, a presença de logradouros fortalezenses que nos são familiares. O principal desses espaços sugeridos é a avenida Desembargador Moreira.
Essa avenida, no entanto, é fantasiada como espaço onde o vento faz seu ninho para anunciar situações fantásticas. São sobrados, casarões e prédios antigos que falam pelos corredores, suam e sangram. Há uma permanente personificação de velhas construções, onde a vida ainda lateja, apesar do abandono. Há uma poética brotando de cada espaço. Os compartimentos são os personagens mais importantes, porque os que ali habitaram, deixaram suas falas que foram incorporadas pelas paredes, pelas escadas.
São histórias tão próximas entre si que parece estarmos diante de um romance e não de um livro de contos. Os aconteceres se entrelaçam e nos transportam para situações sombrias onde a atmosfera de um fantástico aliciado nos põe diante de um iminente aparecimento de fantasmas. Toda a fantasia ali bordada só poderia provocar o nome de “Labirinto”, para o prédio. Mas o próprio texto que se ergue é um prédio abandonado em que o tempo e o vento instauram labirintos.
Essas narrativas de Thereza Leite trescalam corporeidades adquiridas em estruturas de cimento e aço que perdem sua ossatura original e se põem no papel em forma de mitopoéticas imagens. É preciso, pois, que o leitor adentre os compartimentos do texto porque é nele onde todas as velhas construções criam fôlego e falam, verberam e chegam a protestar contra a especulação imobiliária que se torna uma especulação linguística, onde cada palavra pensada precisa do aval do vento, do tempo e das argamassas.
Essas argamassas são antolhos que protegem paredes espiãs, sempre vigilantes diante dos aconteceres no casarão. Nada fica impune aos olhos da casa. A tragédia que ocorre em “Ribeirão do tempo” parece ter depositado nas fundações do mistério, a verdadeira autoria do crime. Entretanto a velha casa presenciou tudo e não perdoa. E mesmo amordaçada, sua voz se liberta pelo alfabeto do vento, diante das inúmeras obrigações herdadas. As pistas para a elucidação do crime são dadas pelas coisas.
Numa tarde de sábado a casa presenciou a tragédia. Pai e mãe mortos a tiro e dois irmãos também assassinados, ficando incólume apenas o filho doente, com a arma na mão e o caçula que não se fez presente. Muito estranho, muito claro, aquele filho doente com a arma na mão. Então para o deslindar do mistério entra o fantástico como explicador. “O crime chocara a cidade, e, dentre os muitos conhecidos que fizeram parte do cortejo, dentro do cemitério, alguns estranharam que os caixões de madeira nobre, que não podiam vazar, seguissem pingando sangue! Porque, dizia a superstição, quando na hora do enterro os caixões vazavam, isto significava que o assassino estava presente.”
“Avenida Feita de Ventos” propõe-se, principalmente, ser classificado como um livro de contos. E consegue, mas nem totalmente. É como alguns livros de contos de Clarice Lispector que trazem na ficha catalográfica o aviso de que é de contos, e o leitor termina por identificar, no seu interior, algumas crônicas. No caso de Thereza Leite, esse fenômeno ocorre em alguns momentos como em “Oficina do Segredo”, “As três Marias” e “Azul com tarja vermelha”. Nesse último, o leitor identifica logo, o fato ocorrido na avenida e de que a crônica policial se alimentou por alguns dias. Esse comportamento da escritora não desmerece a qualidade de seus textos. Não é preciso rotular e sim reconhecer seu mérito de narradora. Verdadeiras ou fantasiosas, suas narrativas se impõem pela lapidação utilizada na arte de contar.
Mesmo com o foco sobre “A avenida dos ventos”, o que aparece em todos os contos, o que caracteriza as narrativas de Thereza Leite é sua diversidade de abordagem. Ela demonstra conhecimentos tão variados que até parece ter feito pesquisas antes de escrever cada texto. Um bom exemplo é “Base para Unhas Fracas”. Esse é um conto antológico, a culminância do livro. Há tantos conhecimentos antropológicos em torno da condição feminina em várias partes do mundo, que o leitor às vezes suspende sua atenção ao enredo para mergulhar no ensaio em que se torna o texto. Entretanto emerge para a narrativa porque a rebeldia da personagem é exemplar ao se posicionar nua repintando um outdoor.
O que cativa mais nas narrativas de Thereza Leite é seu pendor por apresentar saberes. Não são intertextualidades. São conhecimentos que surpreendem o leitor, e que se revestem de um aspecto até didático. O livro ensina além do que se propõe. Há conhecimentos de Antropologia, de Comunicação, de ambientação e dos meandros da linguagem. Sua arte de narrar envolve todos esses aspectos. Avenida dos ventos é um livro saboroso, sinestésico, com gosto de maresia. Nele, o leitor entra pela ficção e sai pela realidade, pois seus signos nos remetem a uma paisagem que termina por nos ser familiar: Fortaleza.

Batista de Lima
Escritor, professor e membro da ACL

Um comentário:

  1. Eu poderia dizer um monte de algos, mas fico mesmo só no hummmmmmmmmm que bom.

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