sábado, 9 de agosto de 2014

"Amulherada", crônica de Raymundo Netto para O POVO


Mulheres são assim: com elas ninguém pode, mesmo sem o propalado bigode, ou buço, para não me começar mal. Em tudo são elas melhores que o homem, até na conquista do afeto de outras mulheres, provavelmente porque as ouvem mais, choram com elas, não se apressam em oferecer respostas, entregam-se por inteiro, trocam peças de roupas e, com sorte, não deixam as cuecas no chão nem participam de peladas com os amigos.
Mas muitas mulheres são machistas. Mesmo após anos de consolidada conquista feminista, algumas não apreciam quando “seus homens” assumem, com gosto, funções antes “de mulheres”. Constrangidas, exigem deles — e para eles defendem — aquilo que elas acreditam ser “coisa de homem”, mesmo quando seu parceiro não se sente envergonhado em nada por não fazê-las.
Vai entender? A mulher traz no seu kit básico existencial uma lógica muito singular, própria de um seu momento, que pode ser qualquer uma e em qualquer um. Após a justificação da diagnose fisiológica da famigerada TPM, aí, sim, todas as “faces de Eva: a bela e a fera”, indissociáveis ao kit, tomaram vulto numa proporção escandalizante.
Afinal, somente as mulheres conseguem entrar numa loja e derrubá-la inteirinha, sem a pretensão de compra, e saírem, numa boa, sem levar nada. Somente elas param o trânsito para xingar aquele motoqueiro com cara de traficante que encostou no seu carro — nem arranhou — ou aquele outro a ousar invadir a sua frente na faixa. Apenas elas aprontam o maior barraco no meio da rua, em pleno meio-dia, para exigir único real cobrado indevidamente, ou se dignam a levar encartes de promoções aos supermercados, criando filas, para provar aos caixas que aquela loja vai perder seus fregueses para a concorrência. Só mesmo mulheres para conseguir dirigir, passar blush, pó, rímel e escovar os cílios ao mesmo tempo. Somente mulheres acham demais ir a festas ou locais abarrotados de todos os tipos de gangues de jovens hormonalmente mal intencionados, com shortinhos minúsculos e decotes maiúsculos, ao lado de seu namoradinho aterrorizado, e, dentre tantas outras coisas, apenas as mulheres, e somente elas, abrem mão de qualquer coisa para passar uma tarde inteira num raio de salão de beleza apenas para enfeitar as unhas. Pior: alegam fazer isso SÓ para agradar o marido, coitado, a preferir a sua companhia, mas, ao vê-la chegar estressadíssima: “O salão estava lotaaaado... Tive que esperar e ainda quiseram botar uma loura fresca — ou magrela, sempre tem uma — na minha frente!” Isso, sem contar na briga com o rapaz que estava pastorando o carro a exigi-la aquela moedinha ou, para terminar, com o ódio daquele barulho no carro que ela não sabe de onde vem, mas que está a deixando maluca e o marido não resolve nada...
Porém, as mulheres são criaturas divinas, pois se o diabo entendesse delas não teria rabo nem chifre, como diria o Stanislaw... E, portanto, devem ser compreendidas — entendidas não creio —, amadas nos limites que o amor, seja lá o que isso for, impõe.
Esse homem, parceiro em segundo plano desta vida “especial”, tem que sagrar-se pela humildade e paciência, viver em contemplação, falar menos — principalmente quando intimado ao contrário —, entender por “verdade” tudo aquilo que lhes faz bem e belas, esquecer tudo aquilo que elas insistem em lembrar sempre e jamais esquecer a dica de Nelson: “Sem dentada não há amor possível”.


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