sábado, 5 de março de 2016

"Vintage Café", por Raymundo Netto para O POVO


Você algum dia chegou a pedir em restaurante um prato de batatas fritas e num segundo de nenhum esforço conseguiu contá-las no prato? Pois eu sim. Eram 4! Imaginei alguém na cozinha, com a ponta dos dedos, pegando aquelas tirinhas secas e meio que passadas do ponto fazendo “cruzinhas”. O pior foi sair do badalado lugar devendo quase uma perna de calça, com uma fome maior do que quando cheguei e a certeza de que essa vida gourmetizada, tempo em que bolinho se chama cupcake, nada tem a ver comigo.
Não sou especialista em coisa nenhuma, e incluo gastronomia na relação, entretanto, como gosto de comer bem. A isso associo o sabor da comida ao da(s) companhia(s), do local e a outras surpresas possíveis de nos inspirar a vida ou pelo menos uma crônica, como essa.
Almoço todos os dias no Vintage Café-Brechó-Antiquário. A casa, provavelmente construída ao final dos anos de 1960 para o início dos anos de 1970, tem no corredor – gosto de chamar de oitão –, placas de madeira grafitadas, garrafas de refrigerante penduradas, arandelas e uma maravilhosa área com uma mesa comprida e cadeiras de madeira, meu “canto”.
Chego cedo. O silêncio inda veste a casa. Uma fresca que vem lá do quintal me esquece o calor, e, enquanto me alheio do trabalho e de mim, assisto às pessoas que marcham apressadas na pracinha da Professora, em frente, É quando me vem o seu Gil Naddaf que, sorridente num bom-dia de quem traz também saborosas histórias de vida, vem guardando seus óculos de hastes amarelas para anunciar as duas opções do dia. Sim, há sempre duas, sem sofrimento de debulhar cardápios, numa lista de encher a boca: escalopinho de carne, bisteca de porco no forno, pescada branca, linguiça mineira, frango ao creme de maionese, filé de frango marinado ao gergelim, rondele, acompanhados de molho de cerveja preta, legumes refogados, caponata de berinjela, batata no forno, suflê de chuchu – incrível como conseguem dar sabor a coisas tão sem graça – ou a farofinha especial da chef Cris Naddaf. Como entrada, se assim o comensal o desejar, traz uma tigela branca de duas asas com feijão carioca ou preto. E o prato quando chega, meu Deus, que beleza! Todo colorido, quente, de acariciar o estômago, e há sempre uma surpresa de acompanhamento, além de sobremesas e o cafezinho.
Enquanto comemos, se estivermos nas áreas internas, podemos ver uma bicicleta inglesa sobre nossas cabeças, conjuntos de jantar, garrafas, vitrolas, castiçais, bibelôs, telefones, brinquedos de lata, aparelhos de rádio, entre outras inúmeras peças raríssimas do antiquário do Gil, do qual sou também cliente e “ouvidor”.
Com pouco, atravessa a porta americana da cozinha a Cris, esfregando as mãos, sorrindo de rosto inteiro num vestido floral, chamando a todos “filhinhos” pelos nomes, nos acolhendo em abraços, perguntando sobre o prato do dia, e, se der, ainda propondo opções – sabe quem come o quê e o quanto.
Para mim, os ingredientes essenciais do lugar são esses: qualidade, sabor, delicadeza, artesania e o invulgar tempero “gostinho de nossa casa”, experiência saudosa de todo que, franca e gostosamente, eu só sinto hoje no Vintage* dos Naddaf.

 (*) Acompanhe o Vintage no facebook: www.facebook.com/vintagecafebrecho/?fref=ts

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