sexta-feira, 27 de maio de 2016

"O Esgoto das Ruas", de Raymundo Netto para O POVO

Até há pouco, estranhava o silêncio daqueles a quem pensava povo brasileiro. Havia apatia e insensibilidade aos acontecimentos, descaso à miséria e à opressão de muitos e ausência nas decisões políticas que interferiam diretamente na sua vida. Daí, a necessidade de sensibilizar e mobilizar, conduzi-lo à arena popular, ocupando o espaço que a ele pertencia, reivindicando melhorias e defesa das conquistas sociais, antevendo o país que queríamos ser, o que nos definiria perante o Mundo.
Hoje, nos parece que algo surpreendentemente mudou: pedíamos vozes, mas vimos emergir o esgoto das ruas, o discurso da individualidade, do egoísmo, da exclusão, da intolerância, do oportunismo, da tirania, da tortura e do estupro, numa sabotagem clara dos direitos humanos, do diálogo, do respeito às diferenças e da justiça social. Do contido esgoto, odioso recalque, a busca de vantagens pessoais e/ou de classe, de dominação de gênero e cor, do preconceito e de reconstrução de privilégios de uma colonial elite de salão.
O Brasil, historicamente golpista (d. Pedro I, Deodoro, Getúlio, Castelo, Temer...), sabendo que os filisteus não fogem a luta, nos guardou debaixo do tapete os velhos discursos de censura ideológica, do conservadorismo familiar, do divino autoritarismo, de “salvação nacional” pela ordem (leia-se “repressão”) e pelo progresso (leia-se “alimentação do capital”), num remake vintage da política “revolucionária sem sangue”, como vangloriavam os EUA, país terrorista que apoiou o Golpe de Estado de 64.
Usa-se a bandeira, como a exigir identidade fácil e futebolesca, símbolo de utilidade apenas ao jogo do poder, à manobra política e interessada que todos os dias somos obrigados a assistir com naturalidade e impunidade pela lama de machados, jucás, renans e sarneys, com a certeza de que vem mais frotas por aí. Nas conversas, o GOLPE, que diziam ser “viagem”, é declarado abertamente, com possibilidade de deter a operação Lava Jato, na qual sobrará para muitos que orientam o discurso do esgoto, o que está fazendo que se negociem mais manobras, como a de enfraquecer delações e a de oferecer a “paz mundial”, como antes, num “Brasil: ame-o ou deixe-o”.
O governo suposto interino, associado a um legislativo fake e a um judiciário que lava as mãos enquanto tem a pequenez de negociar aumento em oportunidade de crise, conseguiu emplacar sete ministros do Lava Jato (foro privilegiado?), indicando também, como líder do governo na Câmara um dos defensores do Eduardo Cunha, sendo ambos investigados, além de colocar logo na Justiça e Cidadania um homem com atuação reconhecidamente repressiva, advogado em mais de 100 processos associados à lavagem de dinheiro e corrupção pela organização PCC. Até a frase que inspirou o discurso de posse do temerário conspirador (“Não fale em crise, trabalhe!”) *, sabe-se agora, pertence a um condenado por tentativa de homicídio, venda de combustíveis roubados, sonegação fiscal, estelionato e formação de quadrilha. E então, como querer reação desse esgoto, como querer que ele bata panelas pela educação, pela moralidade e justiça? Como querer que ele, por sua natureza, não comungue com essa merda toda?


(*) www.conversaafiada.com.br/politica/homicida-e-sonegador-preso-inspira-temer

3 comentários:

  1. Caro, Raymundo Netto, está perfeito esse texto sobre a atual situação do Brasil. Uma triste realidade que nos angustia, mas não nos abate. Estamos a postos para lutar e recuperar o nosso país, com os direitos conquistas, a política social, a tolerância e alegria, que nos foi usurpada por esse golpe disfarçado de impeachment, feitos a muitas e muitas mãos ambiciosas, não só de maus brasileiros, mas também de estrangeiros acostumados a fazer esse jogo golpiya mundo a fora. Viva a Democracia! Viva o Brasil!Fora Temer!Parabéns, Raymundo pelo belo e lúcido texto!

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  2. Caro, Raymundo Netto, está perfeito esse texto sobre a atual situação do Brasil. Uma triste realidade que nos angustia, mas não nos abate. Estamos a postos para lutar e recuperar o nosso país, com os direitos conquistas, a política social, a tolerância e alegria, que nos foi usurpada por esse golpe disfarçado de impeachment, feitos a muitas e muitas mãos ambiciosas, não só de maus brasileiros, mas também de estrangeiros acostumados a fazer esse jogo golpiya mundo a fora. Viva a Democracia! Viva o Brasil!Fora Temer!Parabéns, Raymundo pelo belo e lúcido texto!

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    1. Valeu, Mônica, pela leitura e reflexão. É isso aí. Continuemos! Abraço.

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